O pior aniversário da minha vida: a primeira morte por covid no Amazonas

No dia 12 de janeiro de 2020, antes de pedir demissão do Jornal que eu trabalhava, escrevi uma reportagem sobre pesca esportiva em Parintins, intitulada “Muito mais que a pesca”.

O principal entrevistado daquela matéria foi Geraldo Sávio, na época presidente da Associação de Pesca Esportiva de Parintins. Nós trocamos mensagens pelo WhatsApp, e ali fizemos uma entrevista. Há quem diga que não se pode entrevistar uma pessoa pelas redes sociais, pois se trata de monólogo. Talvez para quem ficou parado no tempo e não compreende a importância das novas ferramentas de tecnologia de informação e comunicação (TICs) existentes desde os anos 80, antes mesmo do processo de convergência iniciar na década de 90.

Esta é uma reflexão válida a se fazer, pois faz parte hoje da prática jornalística, e isso eu falo por mim, desde quando iniciei no meu primeiro emprego como repórter em Manaus no mês de novembro de 2018.

Vale destacar aqui sobre essa história, que Geraldo Sávio, a quem eu tinha entrevistado, foi solicito e me ajudou muito naquela matéria. Eu nunca o conheci pessoalmente, mas eu soube através das redes sociais que era uma pessoa descontraída e bem conhecido na região do Baixo Amazonas, pois atuava como empresário.

Você deve está se perguntando porque eu estou contando sobre isso aqui. Pois bem, este homem a qual recordo, infelizmente foi a primeira vítima fatal da covid-19, às 20:30h do dia 24 de março de 2020, no hospital Delphina Aziz, na capital amazonense. Ele era um parintinense como eu. E foi o primeiro a ser infectado do município.

A morte do empresário foi o marco inicial da maior tragédia sanitária da humanidade para nós que estávamos por aqui.

Esta data marcou para sempre vida. Neste dia, era meu aniversário, completava 24 anos. E para piorar, perdi uma tia também naquela data. Não foi de covid, mas esta doença impediu que eu pudesse me despedir, pois os enterros seriam mais restritos, e os familiares não poderiam mais abrir o caixão.

O dia foi perturbador, não me esqueço da sensação de não poder fazer nada. Era eu num vazio tamanho que sequer conseguia chorar.

Era um jornalista de folga, querendo voltar a trabalhar para tentar ajudar, informar as pessoas sobre aquele vírus. Queria fazer alguma coisa. Naquele momento eu já não pensava mais no que estava por vir. Sinceramente, pensava em Geraldo Sávio, que dois meses antes de sua morte, foi meu entrevistado. Esse cara me ajudou.

As vezes é preciso entender o jornalismo além da teoria, técnica e da prática. É preciso refletir e os nossos sentimentos, mesmo em ofício de repórter, não podem ser ignorados. Não podemos ser indiferentes com a dor, o sofrimento, com o luto. É preciso viver agora para não sufocar no depois.

Eu senti muito por viver aquilo. Quando ele morreu, senti como se fosse meu amigo, da minha família, justamente no dia que perdi minha tia.

Geraldo Sávio, receba minhas orações. Com muita luta, conseguimos superar um tempo sombrio que viria após a sua perda. Aos seus familiares, meus sentimentos. A saudade é eterna.

Eu sei que escrever tudo isso aqui não trará mudança aos fatos. Mas peço sua reflexão.

Por fim, “Parabéns para mim, nesta data não tão querida”. Isso é uma memória escrita para registrar, dia 24 de março de 2020.

Pois, agora escrevo aqui aos 27 anos, no dia 30 de dezembro de 2023. Gabriel, você vai vencer. Um forte abraço de seu amigo jornalista. 

Gabriel Ferreira Fragata

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Foto: Reprodução

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